2 de dezembro de 2006

Cidadãos esquecidos

Uma intenção pode ser maravilhosa, mas na realidade tudo começa com uma ação. E enquanto muitos escolheram reclamar e acusar os governos de serem os únicos culpados pela má distribuição de renda, pela fome, pelo 69º. lugar no ranking do Índice de Desenvolvimento Sócio-Econômico e por tantos outros problemas, o jornalista e idealizador da Revista Idéia Social, Ricardo Voltolini, resolveu ir além.

Voltolini, que há mais de dez anos milita na área de Jornalismo Social, decidiu fazer algo para melhorar o Brasil. Precisava contar histórias de pessoas que, como ele mesmo diz, são vistas como cidadãos de segunda classe por conta da pobreza e da falta de cultura.

Uma destas histórias foi “Meninas de Turbantes do Pará”. De cabelos bem compridos, em respeito à religião, centenas delas acabam vítimas de escalpelamento. Isto acontece dentro do principal meio de transporte da região, os barquinhos de motor de popa, que não possuem segurança alguma. Os cabelos das jovens enroscam no equipamento e são arrancados do couro cabeludo. Logo, as meninas têm as suas vidas duramente marcadas por um problema que poderia, facilmente, ser evitado com informação, cuidado e o uso de proteção nos motores.

Para o jornalista, a história das meninas de turbantes foi a mais marcante da sua carreira. “Esta é a história que mais me marcou porque eu pude perceber a extensão e diversidade dos problemas sociais de um Brasil continental e rico em contrastes”.

Para que tragédias como esta não voltem a acontecer, o diretor de redação da Idéia Social acredita que é necessário mais divulgação. Desta forma, a sociedade tem a oportunidade de redescobrir o Brasil e, ao mesmo tempo, refletir sobre a sua parcela de responsabilidade em relação a problemas tão graves, mas que muitas vezes passam despercebidos.

Voltolini enfatiza que a participação da imprensa é essencial para que temas como o das meninas de turbantes passem a ser discutidos com mais freqüência. Mas, segundo ele, o que se vê ainda é muito pouco. “Vejo, com alguma tristeza, que os jovens jornalistas, por desinformação ou alheamento, repetem o equívoco dos velhos jornalistas de achar que tudo o que diz respeito à esfera pública é responsabilidade exclusiva dos governos”.

Para ele, esta desinformação generalizada acontece por causa da evolução tecnológica. Os valores da sociedade mudaram de uma forma tão rápida, que a maioria dos jornalistas não conseguiu acompanhar. Logo, o que se vê nos noticiários são preconceitos que foram estabelecidos há muito tempo e já não deveriam existir mais. “O mundo mudou. Hoje, se fala em sustentabilidade, em tecnologias sociais, em novas formas de arranjos produtivos, em economia solidária, em voluntariado como ferramenta estratégica. Para escrever sobre esse novo Brasil, o novo jornalista precisa compreendê-lo”.

A Idéia Social

A missão da Idéia Social é promover o debate de idéias sobre o terceiro setor, a responsabilidade social e o investimento social privado, analisando contextos e discutindo conceitos que estimulem a reflexão, a formação de conhecimento e a adoção de novas práticas.

“Nossa intenção não é criar mais um espaço para noticiar projetos de empresas ou de organizações de terceiro setor, mas mergulhar a fundo na compreensão do que está por trás dos importantes movimentos de Terceiro Setor e Responsabilidade Social, produzindo debate pluralista de idéias nesses dois campos hoje em ascensão no País. Queremos fazer uma revista diferenciada, que combine informação aprofundada, com qualidade estética e, por essa razão, faça diferença na vida do leitor”, diz Voltolini.

Outra preocupação do jornalista é publicar textos que ensinem as pessoas a fazer algo por uma comunidade. “Além de reportagens e artigos, a Idéia Social publica também estudos de caso e matérias na linha do Como fazer”.

Para a revista, cujo público-alvo são formadores de opiniões, estudantes e organizações do terceiro setor, os princípios que permeiam as pautas são pluralismo de idéias; apartidarismo; criticidade sem denuncismo; educação pela informação, para a revisão e aprimoramento de práticas.

Por meio desta publicação, Voltolini pretende fazer com que a sociedade se torne mais participativa a ponto de se envolver diretamente com uma causa. Um exemplo citado pelo jornalista de que isso é possível é a ONG Sarapó. Ela foi criada por um médico que cuidava das meninas de turbantes, que estava inconformado e queria prevenir o problema e chamar a atenção das autoridades.

“Uma organização que nasce da indignação de um cidadão sensível aos problemas do seu semelhante é uma prova de como o terceiro setor é importante”, diz Voltolini. Para ele, o jornalista é fundamental para disseminar ideais como esse sem preconceitos. “Do contrário, será o mero reprodutor de um discurso passadista, de idéias equivocadas, conceitos que já não mais se sustentam à luz dos novos tempos. Será um jornalista fora do seu tempo”.

Nenhum comentário: